Ciclos e períodos são boas divisões de tempo que podemos usar para refletir, pensar, analisar o que estamos fazendo...
Falar de inclusão digital, pensar a inclusão digital no âmbito de uma política pública é criar tecido para relacionar toda uma ecologia de ações, processos de tomada de decisão, gestão de recursos, métricas de acompanhamento e avaliação, espaço para o inusitado e emergência do novo, enfim, é pensar o computador como um elemento ativador de redes de redes, é pensar em criar campos, espaços públicos para apropriação de tecnologia como ativadora de imaginários.
Segundo Hernani Dimantas (2009), “existe uma lógica subliminar no processo de inclusão digital, que, muitas vezes, fica obscurecida pelo trabalho cotidiano. Projetos de inclusão digital estão focados nos computadores. Não como ferramentas. Mas como centro de acesso à informação. Para entrar fundo neste debate, temos que dissociar a ferramenta do seu fim, redes são formadas por sinapses entre pessoas. E não pela utilização do computador. As pessoas estão em primeiro plano. E daí, podemos imaginar e elucubrar ferramentas para a formação de redes. Dessa forma, digo, que rede tem um espectro mais abrangente do que, somente, o mundo conectado. Está presente em qualquer expressão do relacionamento humano. O computador vem, apenas, facilitar a interatividade entre as pessoas. Aumentando a exposição do sujeito e catalisando inteligências ou as competências.”
O programa se torna, dessa forma, a estrutura organizacional pública que viabiliza e dá sustentação para a apropriação da tecnologia através da implantação de infra-estrutura física (computadores, móveis, cabos, roteadores), infra-estrutura lógica (software, banda larga) e a possibilidade de uso dessa infra-estrutura para livre acesso e livre circulação da informação em rede, ampliando as possibilidades de conexão entre pessoas.
A rede passa a ser a estrutura orgânica que catalisa inteligências, campo de interação que faz emergir possibilidades de organização e reorganização de saberes, vivências e aprendizagem. A rede passa a ser a estrutura que permite novas topologias de conversas, demistificando mediações de papéis sociais, resignificando os meios de construção de conhecimento através da distribuição e descentralização da informação, bem como do acesso direto aos produtores da informação. Campo do emergente, a rede, do ponto de vista da geração da novas formas de organização “é o encadeamento de relações entre componentes ou indivíduos que produz uma unidade complexa ou sistema, dotada de qualidades desconhecidas quanto aos componentes ou indivíduos. Ela assegura solidariedade e solidez relativa a estas ligações, assegurando então ao sistema uma certa possibilidade de duração apesar das perturbações aleatórias. A organização, portanto: transforma, produz, religa, mantém” (MORIN, 2002). Novas formas de conversa, novas formas de interação, novas formas de aprendizado, novas possibilidades de se pensar e executar uma política pública.
Segundo Drica Guzzi, a grande questão que está se formando é a capacidade educativa e cultural de se usar a Internet. Uma vez que toda a informação está na rede ou seja, o conhecimento codificado, mas não aquele de que se necessita , trata-se antes de saber onde está a informação, como buscá-la, como transformá-la em conhecimento específico para se fazer aquilo que se quer fazer.
É essa capacidade de aprender a aprender; essa capacidade de saber o que fazer com que se aprende; essa capacidade é socialmente desigual e está ligada à origem social, à origem familiar, ao nível cultural, ao nível de educação. É aí que está, empiricamente falando, a divisória digital nesse momento. (CASTELLS, 2003, p. 367)
Está cada vez mais evidente que quando falamos de Inclusão Digital estamos falando de diferentes níveis de complexidades.
São diversos os desafios de uma política pública que atue a partir desses princípios, sobretudo, por articular suas estruturas de gestão às redes sociais emergentes de uma ação de inclusão digital. Um dos principais desafios no desenvolvimento de um processo de participação pública consiste em que o governo tenha uma visão holística , integrada ao ciclo de vida da elaboração de projetos e desenvolva tecnologias capazes de dar suporte ao processo de informar, consultar, participar, analisar, promover o feedback e a avaliação (GUZZI, 2006).
A visão holística consiste num conjunto integrado de dispositivos que possam ser efetivamente utilizados pela política pública para a constituição de um programa de inclusão digital que seja pautado pelos princípios da livre apropriação da tecnologia e da ativação de redes sociais. Apresentamos a seguir, a ecologia de dispositivos do laboratório WebLab da Escola do Futuro – USP, utilizada para o programa Acessa Escola.
legenda: Ecologia de dispositivos de política pública de inclusão digital
A ecologia de dispositivos representa o amadurecimento de 9 anos de experiências da equipe do Laboratório em construção de políticas públicas de inclusão digital em diferentes instâncias governamentais: munícipios (Parque Digital-Santo André, Telecentros-São Paulo, MetaReciclagem-Sorocaba, Jovem.com-Campinas), estado (Acessa SP-São Paulo, Juventude SP- São Paulo) e federação (Cultura Digital-Ministério da Cultura, HumanizaSUS - Mininistério da Saúde). É um sistema complexo, levando-se em consideração várias frentes de atuação que se alimentam e retroalimentam formando uma rede de ações que não podem ser entendidas de forma isolada, mas no contexto e na reflexão de seu efeito sobre a parte no todo e do todo na parte, criando interfaces de informação, gestão e emergência de padrões em rede.
A Capacitação é um dispositivo voltado para o contato com os estagiários do ensino médio, os participantes do programa que operam as Salas de Internet, criando um espaço de conversas, de escuta, de compartilhamento de experiências, de produção de sentidos como um vetor que orienta e alinha as ações executivas do programa em torno da emergência de compreensões comuns e compartilhadas de metas e objetivos. É também um espaço de ativação de redes, por proporcionar o encontro presencial entre estagiários de diversas escolas e diversas regiões por onde o programa vem sendo implantado. Como espaço de ativação de redes, a capacitação catalisa e amplia o campo de contato na internet, entre os estagiários. É um elemento fundamental, aproveitado pela Internet e Comunicação como gerador de interesse para que os estagiários possam se ver refletidos nas mídias sociais (Site do Acessa Escola, Orkut, Flickr, Youtube, Twitter e Facebook) do programa, através da produção de imagens, vídeos e textos sobre a capacitação em que os mesmos participaram, além da produção contínua de pautas específicas sobre os temas de interesse do programa: internet, educação, tecnologia e inclusão digital. As informações que sintetizam essas ações de rede são coletadas, analisadas e circulam pelos diferentes atores do programa através das ações de Webanalítica e dos informativos semanais da Operação Web.
Ações que utilizam os espaços das mídias sociais para construção de projetos e apropriação da tecnologia das Salas de Internet para além das possibilidades do acesso livre são canalizadas via Rede de Projetos, um dispositivo que se alimenta de todas as informações e ações conversas geradas pela Capacitação e Internet e Comunicação como elementos de ativação de redes. É o espaço onde usuários, sejam professores, alunos ou funcionários, do programa podem contar suas experiências, encontrar apoio e suporte para executar ideias, construir projetos, divulgar resultados, além de um espaço para emergência de novas possibilidades de uso e apropriação do programa para ações inusitadas, inesperadas, criativas.
Como os usuários efetivamente estão se apropriando da tecnologia das salas de Internet, como é o seu comportamento em rede e o que pensam sobre o programa é uma área que é abordada pela PONLINE, uma ação de pesquisa online com os usuários frequentadores do programa. E junto com todas as informações pelos dispositivos mencionadas, há a área de Conexões Científicas criando um campo de análise e produção de conhecimento acadêmica sobre o programa e para o programa.
Essa é uma possível leitura das interfaces que são oferecidas pelos dispositivos de inclusão digital, outras são possíveis, possibilitando novas ações, melhorias e o desenvolvimento do próprio programa em seu fazer e refazer contínuo.
2 comentários:
Oi, Dalton
Antes: eu não estudo as redes, tampouco participo ativamente de programas de inclusão digital e desconheço as referências legitimadas pelo universo acadêmico nessa área. Só fui parar na MetaReciclagem por "acaso"...
Você citou o Castells, mas acho que o seu próprio texto já "reinventou" esse trecho: essa capacidade é socialmente desigual e está ligada à origem social, à origem familiar, ao nível cultural, ao nível de educação.
E, na minha cabeça, essa reinvenção substituiu a palavra "capacidade" por possibilidade (ou até oportunidade, se for necessária uma palavra mais "pop" pra se referir aos programas de "inclusão"). Isso faz algum sentido pra você ou sou eu que estou operando na lógica da "educadora otimista" (que acha que todo mundo é capaz e faltam apenas situações estimulantes/desafiadoras para a "ativação dos diferentes potenciais")?
bjs
Tati
Tati,
concordo totalmente contigo.
acho que todos temos uma natureza primordial que nos possibilita a capacidade de criação, inovação, desenvolvimento da mente e por aí vai... Sem dúvidas, as condições culturais e as relações de causa-efeito na nossa vida, vai pautando a forma e as possibilidades de nosso desenvolvimento.
bjs,
dalton
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