domingo, 2 de dezembro de 2012

Modelos de redes e novas possibilidades de pensar no campo informacional para bibliotecas: Seminário de Usos de Redes Sociais para Publicação Científica na USP

Pensar em redes é, muitas vezes, uma questão de enxergar como as coisas podem se relacionar entre si. A potência da análise de redes sociais está em permitir visualizarmos as relações que acreditamos existir, facilitando dar contorno e tornar mais evidente que possíveis padrões de relacionamento estamos diante. Pensar em padrões, mais do que pensar naquilo que é determinado, é pensar naquilo que se conjuga nos hábitos, nas tendências de relação que talvez ainda não tenhamos nos dado conta.

Em tese, estamos diante de uma ferramenta de espelhamento, facilitando perceber diversos contextos espelhados nas relações que definem os limites de um sistema. Podemos ver aqui refletidos as políticas de relação, as formas, os modos e as diferentes maneiras possíveis nas quais esses sistemas são concebidos e apropriados por aqueles que lhes utilizam.

Foi com essa motivação como ponto de partida que montei essa apresentação para o Seminário de Usos de Redes Sociais na Produção Científica na USP.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Domínios de si

Apenas por entre silêncios
Há uma voz que fala
A palavra liberta
Dos domínios de si.

Silêncio dos sentidos
Que calados apenas observam
O emudecer do ritmo
...Do pulso que se expande.

Desencontro de palavras
Que de distantes
Se entrelaçam nos ecos
Esvaziados de multidão.

Presença de um ponto final
Demarcando o tempo de espera
De onde já não há entres
E nem o mais do vir a ser.

A secura do que não aperta
E nem constrange de ausência
Não esvai de solidão
O vazio do que se aguarda em estado de alerta...

... Apenas a palavra liberta
Dos domínios de si.

domingo, 18 de novembro de 2012

Jogos de a(r)mar

Da parte que te quer
Metade te quer inteira
Face de outra história
Onde te invento de repente.

Ideia rasteira
Súbita memória
Lembrança do querer
Traço de mim.

Viro página
Rebusco livro
Reencontro verso
Desejo de sim.

Abro mala
Dobro gaveta
Despeço visão
E aguardo, ainda atento.

A outra parte sorri
Brincando de razão
Virando sentimento
Do inverso de si.

Mais, pra quê?
Daqui onde assisto
Vejo a parte que quer
Inventando resistência
Pra ocupar a que não quer
Que se ocupa do argumento do querer

Que já nem liga pro fundamento da existência
Pro sentido do passeio
De passagem devaneio
Nascido por entre olhares de admiração e respeito.

E assim, satisfeito, sigo brincando
De te descobrir de novo
Desenhada na íris refletida
De uma memória de passagem.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Mediações

Ainda há em mim um gemido de espaço
Uma busca sem pergunta
Ou necessidade de resposta

Um olhar que vasculha o vir a ser
Em estado de espera
Aguardando repousarem memórias futuras
Por entre vitrais refletindo possibilidades.

Mas ainda há mais.
Há uma busca de sentindo que transborda palavras
Enveredadas em labirintos nascidos dos limites
Daquilo que tudo que ainda jamais ousei!

Recusa de um lugar na fileira
Dos que já sabem e defendem a verdade
Meu não-dito ainda reflete o espanto
De se deparar consigo mesmo por entre
                           fontes de águas desconhecidas.

E como se já não fosse o excesso
Há ainda mais.

Há o desejo do encontro
Da provocação do que desloca o traço que fixei
Do comum que experimenta e se descobre em próprio ato
Do reinventar-se como prática de si em plena fome que não cessa de mover
Do sentir liberto, presente apenas na verdade do convocar-se a estar ali.

Há o desejo da roda
O que gira, gira junto
Batuque de mão, movimento de perna
O que gira, roda gira
Palavra de centro, olho no olho.

O que gira, ainda ensimesmado, ainda gira aqui
Dentro de mim.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Metade do um

Palavra inteira, fundo de alma
Meia metade do um, pressão do impulso
Olho vazado de um sim
Vaso cortado no traço, trejeito
Sobra de muro, goteira de um risco
Pingando no pulso, tambor de memória.

Sem sombra, sem nada
Palavra inteira virada, dobrada no avesso
Atravessada no trânsito, buraco rasteiro
Ligeiro roteiro de um triz
Meio fio, meia vida, meia medida, meia verdade, meias palavras...

Coragem cruzada, pavor de desvio
No meio da não-resposta, o instante
Onde terra contorna palavra cifrada
Centro de um símbolo
A espreita de ser pega, desnudada em sentido

Revelada em meio ao jogo
Como movimento de um entre
Onde voz se cala e ali me encontro
Descoberto de fronteira, sem borda de contorno
F1 de ajuda ou saída de emergência

Apenas atento, à espera de um sinal.

sábado, 10 de novembro de 2012

O Doutorado: o processo, a vivência e os companheiros

Faz aproximadamente uma semana que aconteceu minha defesa do doutorado. Um processo forte, do começo ao fim, com uma duração de aproximadamente 4 anos, cercados de muitas, mas realmente muitas mudanças que ocorreram em várias faces da vida de lá pra cá. É óbvio que tudo isso foi impactando e foi impactado por aquilo que viria a se tornar essa tese e a forma como a mesma foi senda gerada, gestada e parida.

Desde o começo, fiquei com uma vontade de contar por aqui como foi esse processo, suas principais etapas, aprendizados, produções e conexões que dali surgiram. Bem, eis o momento.

Motivação
A motivação para começar era circunscrita a dois grandes aspectos: o desejo/sonho de aprender a sistematizar melhor uma pesquisa, dando conta de mapear tendências, apontar evidências e construir uma linha de raciocínio própria em meio a tudo isso, além disso, a intuição de que o estudo aprofundado das redes e seus possibilidades de análise abririam um campo novo de trabalho, permitindo ampliar minha capacidade de olhar que com as ferramentas que tinha até então ainda não era capaz.
A intuição foi se mostrando forte o suficiente para apoiar os primeiros passos e, tão rápido quanto eles aconteceram, foi se mostrando também muito útil nos próprios projetos que ia desenvolvendo ao longo desses anos, onde também tive a oportunidade de utilizar parte do que aprendia e experimentar efeitos até então ainda inexplorados.

Mergulhando em um tema
Acredito, depois de tudo isso, que é preciso uma grande coragem e força de vontade para mergulhar fundo, mas fundo no próprio fundo, em um tema. O nível de detalhes que se abrem, as possibilidades infinitas de recombinação daquilo que se lê e daquilo que se pode interpretar, além dos inúmeros atravessamentos que vão acontecendo ao longo do caminho levando a deliciosas dispersões representam uma enorme oportunidade de conhecimento e um perigo enorme de se perder e nunca mais se achar.
Um pouco da disciplina do velho bode só fez ajudar. O mergulho foi delícia e quanto mais conhecia, mais queria conhecer. O ponto de inflexão foi tão forte que a decisão de continuar pesquisando o tema e prosseguir nos estudos foi quase de imediato. Sem dúvida, sei muito pouco do que ainda quero saber e experimentar, mas agora tenho um pouco mais de convicção no caminho a percorrer para chegar nesse conhecimento.
As boas dicas de metodologia científica, como o delicioso livro Como se fazer uma tese, do Umberto Eco, foram sem dúvida divisores de momentos no processo do mergulho. Acho que o que mais ganhei entrando por esse caminho foi a perspectiva de transformar a tese em um jogo. Aí, tudo ganhou um novo sentido. Não importava tanto os resultados a serem obtidos ali, importava mais montar o quebra cabeça, saber encaixas as peças, perceber o que ainda faltava na linha de raciocínio e ir atrás, achar novas pistas, dicas de por onde ir, mergulhar em novas possibilidades, mas saber voltar e fazer o caminho de registro de traço a mais no contorno do que ia me definindo ao longo do texto.
A tese foi projetiva de uma narrativa muito mais pessoal do que técnica. Foi canal de expressão de possibilidades analíticas que não estavam dadas em meu repertório de possibilidades antes desse mergulho. Ver isso tomando forma foi tão prazeroso quanto escrever a própria história.
O mergulho foi fundo. Me levou a novas áreas. Entrei em contato com as Ciências da Complexidade, Estatística Multivariada, Análise Dinâmica de Redes, Biopolítica, Sociologia da Ciência, Antropologia, Psicologia Social e Filosofia, só pra falar de bate pronto daquilo que me ressalta como mais forte nesse momento. Sem dúvida, há mais. Mas essas áreas foram fronteiras novas que foram descobertas e, sem dúvida, apontam ainda muito para se conhecer.
A sensação é de que o mergulho ainda tá em processo. A tese foi apenas uma etapa do respiro necessário para poder continuar.

A orientação
A relação de orientação que estabeleci com a Sueli foi de fato uma relação de outra ordem daquilo que eu estava acostumado em um ambiente acadêmico. Tivemos um contato limitado pelo tempo, sem dúvida, devido a várias agendas complexas, tanto dela quanto minha. Mas, o tempo juntos foi extremamente produtivo no sentido de abrir novas visões do que era a construção de uma tese, de como seguir uma linha de narrativa e de como definir minhas hipóteses, objetivos e perspectivas de modo a realmente me ajudar a entender a mim mesmo, para além daquilo que de fato ia se tornar um produto deste trabalho.

Admiração e respeito surgiram desse processo. Aprendi muito com ela, o que de fato já tenho aplicado na relação com meus próprios alunos na Fatec São Paulo e no Senac Sorocaba, onde tenho orientado os TCCs da moçada por ali. Acho que fica aqui, sobretudo, um desejo de ter mais contato e aprender mais sobre essa forma de pensar e estruturar ideias, o que tanto tem me agradado nos últimos anos.

A produção
Produzir artigos, participar de eventos e utilizar isso como um caminho de conhecimento da própria área da Ciência da Informação na qual estava entrando se tornou um desafio instigante e provocador de um tipo de deslocamento ao qual eu estava pouco acostumado até então. Ir a vários eventos como participante, sentado ali na platéia apenas para ouvir e, quando apresentava um trabalho, falar apenas poucos minutos, acabou me dando uma nova perspectiva do que aquelas pessoas pensavam e como analisam seus temas de interesse.
Conheci muita gente interessante e tive a oportunidade de estabelecer bons contatos ao longo desses anos.
Acho que vale registrar por aqui por onde passei, apresentando trabalhos e vendo o que os outros grupos e estudantes estavam produzindo (as apresentações que fiz nesses eventos estão registradas aqui):

  1. VIII Evidosol
  2. 12º Fisl
  3. 13 ISSI
  4. X CINFORM
  5. IV SECIN
  6. I WPOSINFO
  7. XII ENANCIB
  8. III Seminário de pesquisas em andamento da ECA
  9. 9th CONTECSI
  10. 11º KMBrasil
  11. 3º EBBC
  12. I SITI
  13. 14º Congresso de Tecnologia da FATEC-SP
  14. IV Semana de Pedagogia da UFSCAR
  15. XIII ENANCIB
 Ao longo desses eventos, tive a oportunidade conhecer várias Universidades pelo país, conhecendo também novas pessoas de cada canto por onde passava. Estive na Universidade Estadual do Paraná, Universidade Federal da Bahia, Universidade Federal de Santa Catarina, Universidade de São Paulo, Universidade Federal do ABC, Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade de Brasília, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Fatec de São José do Rio Preto, Universidade Federal de São Carlos e FioCruz no Rio de Janeiro. E também fora do país, tive a oportunidade de estar na África do Sul, em Durban, passando uma semana interessantíssima no congresso da ISSI, onde tive a oportunidade de tomar contato mais próximo sobre como andava a pesquisa na área no exterior, tendo condições de situar onde meu trabalho estava e para onde ainda precisava caminhar. 

Além disso, acho que vale registrar aqui os artigos já publicados e que possuem uma relação direta com esse trabalho de tese:

A defesa
O momento da defesa é de fato um momento único. Espaço onde você vai encontrar com pessoas que leram seu trabalho a fundo e, possivelmente, podem contribuir muito para que você olhe para aquilo que não viu em si mesmo, refletido em seu próprio texto.
Procurei, junto com Sueli, escolher a banca com pessoas que eram referência na área e que poderiam de fato ajudar muito com seu potencial de análise e reflexão. Acabamos convidando a Jacqueline Leta, o Rogério Mugnaini, a Nanci Odonne e a Maria Imacolatta.


Abaixo segue a apresentação que fiz, procurando achar uma síntese do que foi esse trabalho e como mostrar seus pontos mais importantes para as pessoas queridas que também estavam ali presentes.


A apresentação durou aproximadamente 40 minutos e logo passamos para a etapa de arguição, onde os convidados da banca foram trazendo suas questões e abrindo pontos do trabalho que lhe chamavam atenção. A banca trouxe aspectos interessantes, sobretudo quando se tratou de novas possibilidades de reorganização do trabalho e de minha relação com os teóricos como Latour e Foucault. Foi muito útil ver como essa entrada com essas referências repercutiu por ali, percebendo efeitos, possibilidades ainda não exploradas e minhas próprias dificuldades de diálogo ali abertas como um campo de análise que me deu importantes elementos para saber melhor por onde continuar.


Enfim, depois de quase 4 horas de conversa, termina essa etapa de uma forma delícia. Tese aprovada na íntegra, sem necessidade de mudança, recomendação de livro sobre análise de redes sociais e nova etapa de pesquisa começando a ser desenhada.

Os companheiros
Acho que uma das coisas mais bonitas que aconteceu nesse dia da defesa foi contar com a presença de companheiros tão queridos e importantes, não só no processo do doutorado, mas na vida como um todo. Poder falar para essas pessoas, olhar nos seus olhos e apresentar esse trabalho da forma como isso aconteceu foi um presente que de fato mexeu e reconfirmou muitos dos sentidos que eu mesmo estava buscando com a realização desse trabalho.
Não tenho dúvidas de suas questões, suas formas de visão e o modo como foram abordando os próprios resultados do trabalho que fomos desenvolvendo juntos me trouxeram novas perspectivas que acabaram, de uma forma ou de outra, incorporadas pela tese como um todo. Gratidão! :-))))

A tese
Segue aqui o resultado final, que acredito que mais que tudo fale por si.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Para além da inclusão sócio-digital: dos jogos de mercado como objetos de política pública



A palavra inclusão aparece como referência constante em diversas formas de descrição e apresentação de programas, projetos e experiências na política pública de forma praticamente unânime entre os mais diversos entendimentos e posicionamentos das chamadas políticas sociais. Aparecendo, de forma geral, com o sentido de incluir àqueles que não tem acesso a determinados bens materiais, serviços e identificação nas máquinas de governabilidade públicas e privadas, seja por falta de alcance dos mecanismos e possibilidades de articulação das estruturas políticas em ação ou seja pelo entendimento de que as estruturas que fornecem acesso não devem ser geridas pelo própria máquina pública, a inclusão serve como conceito que abre um campo de atuação e serve como critério de análise do que pode estar dentro ou fora.

Visto dessa forma, a inclusão se torna conceito operatório de produção e entendimento do que deveria balizar e sustentar as condições de aplicabilidade de uma política pública. Em outras palavras, se a política é inclusiva, ela dá acesso a determinados valores e modos de vida que entendemos serem necessários para sustentar a condição social ideal visualizada pela política em operação. Se a política não é inclusiva, ela segmenta, classifica, filtra, escolhe favorecer e empoderar aqueles que aparentemente já estão inseridos nas redes de circulação dos serviços e bens ofertados pelas máquinas da governabilidade. O critério que esse conceito operatório facilmente coloca à vista é qual o corte do que se entende por incluído e por excluído, que métodos de medição e análise são utilizados por uma política para operar essa divisão, entendendo que essa divisão explicita uma escolha, um campo de atuação e, sobretudo, intervenção que a política em questão se propõe a lidar. É a possibilidade de análise dessa segmentação e dos critérios atrelados a ela que nos permite reposicionar a questão sobre o conceito de inclusão e como ele vem sendo utilizado em nossas políticas públicas em vigência atualmente.
Vale aqui explicar, clareando algumas pré-condições como ponto de partida para a breve análise que aqui se estabelece, que o título desse artigo inclui a palavra “digital” na relação com inclusão social com uma intenção clara no que se refere a dimensão digital como mais um espaço, um universo e um campo de produção de diferentes formas e tipos de sociabilidade. Entende-se, desse modo, que essa dimensão é vista como um espaço de relacionamento humano que pode e é visto por determinadas políticas públicas como campo de intervenção e presença das máquinas de governabilidade que colocamos aqui em análise. A inclusão digital é vista aqui como o acesso a esse espaço de relacionamento humano, a esses canais e redes de interação, apenas acessíveis pelo uso de determinadas tecnologias, que constroem e pautam fluxos de comunicação, bens materiais e imateriais, serviços, formas de ativismo, atravessando e sendo atravessado pelas outras tantas dimensões de sociabilidade nas quais se percebem os espaços de relacionamento humano. O conceito, os critérios do que está dentro e do que está fora, além das formas de operação que a expressão “inclusão” fornece à ação de uma política pública permitem intervir também através do digital como espaço de governabilidade, sobretudo, daquilo que se entende como uma ação social proposta por uma política.
Mais do analisar a questão do digital, se pretende aqui analisar a questão da inclusão como modo de intervenção no social. Bruno Latour (2012) resgata a etimologia da palavra “social” explicitando com mais clareza sobre o quê incluir ou não incluir está se falando aqui.

A etimologia da palavra “social” em si é bastante instrutiva. A raiz é seq-, sequi, e a primeira acepção é “seguir”. O latim socius denota um companheiro, um associado. Nas diferentes línguas, a genealogia histórica da palavra “social” designa primeiro “seguir alguém” e depois “alistar” e “aliar-se a”, para finalmente exprimir “alguma coisa em comum”. (…) “Social” como em “problemas sociais” ou “questão social” é uma inovação do século 19. O vocábulo paralelo “sociável” alude à capacidade que tem o indivíduo de de viver polidamente em sociedade” (Latour, 2012, pag. 24).

Mas, que coisa em comum é essa e que nível de inserção é esse que permite viver polidamente em sociedade? Como surge a questão social como um espaço de intervenção que dá condições e sustenta o surgimento de um sem número de políticas públicas, logo, estratégias de governabilidade? De que modo incluir tem a ver com condicionar modos de vida e inserir em fluxos de operação da máquina governamental já conhecidos, sustentando e sendo sustentados por condições que mantém as ordens dominantes instauradas?
Há uma forma de pensamento que vale aqui explicitar, mesmo que de forma esquemática e reducionista, com a intenção de colocar de modo mais claro que relação é essa entre “inclusão”, “social” e “governo” que está posta nesse espaço de análise que se estabelece. Inclusão vem sendo aqui descrita como um conceito operatório que viabiliza determinadas políticas públicas, permitindo estabelecer critérios do que está incluído e do que deve ser objeto de atuação do governo para promoção da inclusão. Logo, o governo atua, de certa forma, intervindo nessa “questão social” com o objetivo de pautar determinadas condições de vida em sociedade. Que condições são essas?
Tendo estabelecido aqui alguns princípios de entendimento do conceito “inclusão” e “social”, vale aqui avançar um pouco mais conceituando como se pode entender o conceito de “governo” para tocarmos em algumas das questões que foram aqui levantadas.

... governo, aqui, é um modo de conceitualizar todos aqueles programas, estratégias e táticas para a condução da conduta, mais ou menos racionalizados, para agir sobre as ações dos outros de maneira a alcançar certos fins. Nesse sentido, pode-se falar em governo de um navio, de uma família, de uma prisão ou fábrica, de uma colônia e de uma nação, assim como de um governo de si” (ROSE, 2011, pag. 25).

Chega-se aqui a um ponto interessante de posicionamento desses conceitos. Governa-se para agir sobre os outros, para conduzir conduta. O sociável e a questão social torna-se campo de intervenção, modo de atuar para induzir e promover determinados tipos de conduta e modos de ação desejados. Incluir torna-se modo de produzir políticas públicas que tenham por intenção estabelecer critérios do que está dentro e do que está fora desses modos de sociabilidade polidos e desejados pelo governo das condutas.
No entanto, essa governança de conduta não acontece nos tempos em que vivemos de modo aleatório. Vive-se sob a influência de um tipo de racionalidade fundamentalmente influenciada por questões de fundo econômico e financeiro. Os parâmetros de renda e padrões de consumo servem de critérios de regulação de inúmeras formas do que condiciona os modos de vida e espaços de sociabilidade por onde os seres humanos interagem e se produzem mutuamente. O que serve de critério entre incluído e excluído se baseia diretamente nos indicadores econômicos que categorizam as diferentes classes, comunidades e formas de segregação.
Buscando entender como o jogo econômico pauta as formas de governo atuais, Foucault (2008b) deixa claro o que define esse critério do incluído/excluído que aqui se coloca em evidência.

Ora, essa ideia de que deve haver uma regra de não-exclusão e de que a função da regra social, da regulamentação social, da seguridade social no sentido amplo do termo deve ser a de garantir pura e simplesmente a não-exclusão de um jogo econômico que, fora disso, deve se desenrolar por si mesmo, é essa ideia que é aplicada, esboçada em todo caso, em toda uma série de medidas mais ou menos claras” (FOUCAULT, 2008b, pag. 278).

Logo, as políticas de inclusão, sejam elas a partir dos espaços do digital ou não, vistas dessa forma tornam-se estratégias de um governo visando a inserção das condutas por dentro desse jogo econômico, entendendo que uma vez inseridas no jogo o próprio jogo têm condições de se regular, operando a partir de estratégias que deixam de serem espaços de atuação do governo para serem espaços de atuação do mercado. Criar condições de consumo, criar condições de se posicionar em algum lugar no jogo econômico é, portanto, posicionar as bases dos modos de vida que essa governança de condutas pretende estabelecer. Garantir que o espaço de liberdade seja o espaço de liberdade do mercado, ou seja, que a liberdade se dê a partir das regras de funcionamento e dos contornos estabelecidos pelo mercado é garantir a eficácia e os critérios de sucesso das políticas de inclusão, melhorando níveis de renda e condições de inserção num jogo para o qual o próprio governo foi pensado e construído para manter.
É disso que se trata, em sua grande maioria, as políticas públicas de inclusão produzidas no âmbito de governos constituídos como neoliberais, sendo sustentados e mantidos como condições de existência e garantias da liberdade dos próprios mercados que os produzem. Se a possibilidade de livre comércio é o interesse maior no jogo de interesses do que está em disputa, o papel do governo é garantir que ele ocorra, produzindo condições para que se amplie nas esferas em que ainda não atua, incluindo no “social” os que estão fora do jogo.
Vale dizer que aqui não se coloca um juízo de valor explícito, afirmando que esse modo de entender os conceitos que analisamos defina essas políticas como negativas ou num sentido depreciativo qualquer. Ao contrário. O que aqui se objetiva é estabelecer alguns critérios de análise para que se perceba com um pouco mais de clareza o que de fato parece estar em jogo. É apenas entendendo como tem se produzido esses espaços de atuação que temos melhores condições de se ver dentro do próprio jogo, percebendo que papel ocupa, que discurso sustenta e se esse discurso parece operar políticas em direção ao que de fato desejamos ou a um jogo econômico que talvez ainda não se tenha percebido como o que tem regulado os modos de vida e fazer político atuais.
Logo, já encaminhando para algumas ainda breves conclusões que tiramos dessas relações estabelecidas, falar de questões como empoderamento coletivo, constituição de sujeitos autônomos e a possibilidade de produzir espaços de co-gestão é falar de outros jogos que parecem não dialogar e serem compatíveis com essa busca contínua da eficácia financeira e econômica desse modo de governar. Além disso, é falar de outras possibilidades que criem condições e funcionem como outros modos de operar política que não a visão da inclusão nos jogos de mercado.
É novamente Foucault (2008a) que parece dar pistas interessantes de posicionamento do olhar para além desse jogo:

Então, frente a essa política global do poder se fazem revides locais, contra-ataques, defesas ativas e às vezes preventivas. Nós não temos que totalizar o que apenas se totaliza do lado do poder e que só poderíamos totalizar restaurando formas representativas de centralismo e de hierarquia. Em contrapartida, o que temos de fazer é instaurar ligações laterais, todo um sistema de redes, de bases populares” (FOUCALT, 2008a, pag. 74).

É para além dos jogos de mercado, para além da economia como critério que determina modos de relacionamento e condiciona modos de vida que outros níveis de pensamento abrem espaço e permitem operar em estruturas de representatividade que não reproduzam essas formas de centralismo e hierarquia que são as condições de base da própria existência dos modos de governabilidade atuais. É por outro caminho que deslocamos essa racionalidade e abrimos espaço para outras formas. É por outras condições de relação, onde os posicionamentos se lateralizam, onde o coletivo opera como aquele que constrói contorno, que define seu espaço e se vê como agente de seu próprio modo de vida que outras redes são possíveis, que outros fluxos de interação podem ser pensados. E nisso, sem dúvida, a dimensão do digital pode colaborar na produção de outros jogos de relacionamento, não como condição de partida, mas como condição de apropriação de uma racionalidade que lhe antecede e opera por outros valores.

Referências
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Graal. 26ed. 2008a. 295p.
FOUCAULT, Michel. Nascimento da biopolítica. Martins Fontes. 2008b. 474p.
LATOUR, Bruno. Reagregando o social: uma introdução à teoria do Ator-Rede. Edufba/Edusc. 2012. 399p.
ROSE, Nikolas. Inventando nossos selfs: psicologia, poder e subjetividade. Vozes. 2011. 308p.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O olhar adulto


Excelente dica da Pat, na lista de editores da Rede Humaniza SUS:

Foi ele mesmo que me contou, como confissão de cegueira, dando depois permissão para que eu relatasse o milagre desde que não revelasse o santo. Médico, chegou a seu consultório com seus olhos perfeitos e a cabeça cheia de pensamentos. Eram pensamentos graves, cirurgias, hospitais, e os doentes o aguardavam na sala de espera.
Entrou o primeiro paciente que se submeteu mansamente à apalpação médica. Terminada a consulta, escrita a receita, no ato da despedida ele fez um elogio: “Doutor, que lindas são as orquídeas na sua sala de espera!”
Meu amigo sorriu embaraçado, com vergonha de dizer que não havia notado orquídea alguma na sala de espera e que, portanto, não sabia da beleza que o doente notara. Teve vergonha de revelar a sua cegueira. Entrou o segundo paciente. Ao final da consulta, sem conseguir conter o que sentia, observou: “São maravilhosas as orquídeas na sua sala de espera, doutor!” Novamente o sorriso amarelo, sem poder dizer o que não sabia sobre as orquídeas que não havia visto.
Veio o terceiro paciente e a coisa se repetiu do mesmo jeito. Aí o doutor deu uma desculpa, saiu da sala, e foi ver as orquídeas que o jardineiro colocara na sala de espera. Eram, de fato, lindas. Mas aí veio o agravante, pois o paciente, não satisfeito com a humilhação imposta ao doutor cego, observou que, na semana anterior, a árvore dentro da sala de consulta, plantada num vaso imenso, num canto, não era a mesma que ali estava, naquele dia. Mas o doutor cego de olhos perfeitos não notara a presença de árvore naquele dia nem a presença da árvore na semana anterior...
Ah! Você espera que tal cegueira possa existir! Mas eu lhe garanto que é assim que funcionam os olhos dos adultos em geral.
Lá vão pelo caminho a mãe e a criança, que vai sendo arrastada pelo braço – segurar pelo braço é mais eficiente que segurar pela mão. Vão os dois pelo mesmo caminho, mas não vão pelo mesmo caminho. Blake dizia que a árvore que o tolo vê não é a mesma árvore que o sábio vê. Pois eu digo que o caminho por que a mãe anda não é o mesmo caminho por que anda a criança.
Os olhos da criança vão como borboletas, pulando de coisa em coisa, para cima, para baixo, para os lados, é uma casca de cigarra num tronco de árvore, quer parar para pegar, a mãe lhe dá um puxão, a criança continua, logo adiante vê o curiosíssimo espetáculo de dois cachorros num estranho brinquedo, um cavalgando o outro, quer que a mãe também veja, com certeza ela vai achar divertido, mas ela, ao invés de rir, fica brava e dá um puxão mais forte, aí a criança vê uma mosca azul flutuando inexplicavelmente no ar, que coisa mais estranha, que cor mais bonita, tenta pegar a mosca, mas ela foge, seus olhos batem então numa amêndoa no chão e a criança vira jogador de futebol, vai chutando a amêndoa, depois é uma vagem seca de flamboyant pedindo pra ser chacoalhada, assim vai a criança, à procura dos que moram em todos os caminhos, que divertido é andar, pena que a mãe não saiba andar por não ter os olhos que saibam brincar, ela tem é muita pressa, é preciso chegar, há coisas urgentes a fazer, seu pensamento está nas obrigações de dona de casa, por isso vai dando safanões nervosos na criança, se ela conseguisse ver e brincar com os brinquedos que moram no caminho, ela não precisaria fazer análise...
A mãe caminha com passos resolutos, adultos, de quem sabe o que quer, olhando pra frente e para o chão. Olhando para o chão ela procura as pedras no meio do caminho, não por amor a Drummond, mas para não dar topadas, e procura também as poças d’água, não porque tenha se comovido com o lindo desenho do Escher de nome Poça D’água, uma poça de água suja na qual se refletem o céu azul e os ramos verdes dos pinheiros, ela procura as poças para não sujar o sapato. A pedra do Drummond e a poça de água suja do Escher os adultos não vêem, só as crianças e os artistas...
A mãe não nasceu assim. Pequenina, seus olhos eram iguais aos do filho que ela arrasta agora. Eram olhos vagabundos, brincalhões, que olhavam as coisas para brincar com elas. As coisas vistas são gostosas, para ser brincadas. E é por isso que os nenezinhos têm esse estranho costume de botar na boca tudo o que vêem, dizendo que tudo é gostoso, tudo é para ser comido, tudo é para ser colocado dentro do corpo. O que os olhos desejam, realmente, é comer o que vêem. Assim dizia Neruda, que confessava ser capaz de comer as montanhas e beber os mares. Os olhos nascem brincalhões e vagabundos – vêem pelo puro prazer de ver, coisa que, vez por outra, aparece ainda nos adultos no prazer de ver figuras. Mas aí a mãe foi sendo educada, numa caminhada igual a essa, sua mãe também a arrastava pelo braço e, quando ela tropeçava numa pedra ou pisava numa poça d’água, porque seus olhos estavam vagabundeando por moscas azuis e cachorros sem-vergonha, sua mãe lhe dava um safanão e dizia: “Olha pra frente, menina!”
“Olha pra frente!” Assim são os olhos adultos. Olhos não são brinquedos, são limpa-trilhos. Servem para abrir caminhos na direção do que se deve fazer. Assim eram os olhos daquela minha amiga que os usava para cortar cebola sem cortar o dedo, até que, um dia, o olho que morava dentro dos seus olhos se abriu e ela viu a beleza maravilhosa do vitral translúcido que mora nas rodelas de todas as cebolas, e ela tanto se espantou com o que via que pensou que estava ficando louca.
Coitados dos adultos. Arrancam os olhos vagabundos e brincalhões de crianças e os substituem por olhos ferramentas de trabalho, limpa-trilhos. Asssim eram os olhos daquele meu amigo médico: não viam nem as orquídeas nem as árvores que estavam dentro do seu consultório. Seus olhos eram escravos do dever. E ele não percebia que as coisas ao seu redor eram brinquedos que pediam aos seus olhos: “Brinquem comigo! É tão divertido! Se vocês brincarem comigo, eu ficarei feliz, e vocês ficarão felizes...”

Rubem Alves

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Brincando com dados no Gephi:

Fazia um tempo que tinha colocado aqui na listinha de coisas a experimentar brincar um pouco com o Gephi, um sistema de visualização e exploração de grafos.

Bem, pra começo de conversa o Gephi tem uma história de desenvolvimento bastante interessante, dado que ele é desenvolvido por um consórcio envolvendo empresas, universidades e desenvolvedores pelo mundo afora. Um modelo híbrido, com uma intenção clara: trabalhar análise de dados para redes em um nível singular de interatividade e excelência técnica. O resultado é que a ferramenta é incrivelmente fácil de usar e fornece resultados de uma forma prática que eu nem sequer imaginava, dado a experiência prévia que já tive com outros softwares, como Pajek, Netdraw, Visone e Ucinet.

Funcionalidades como calculo de métricas, mapeamento de comunidades, formatação da rede por atributos, definição de parâmetros de nós e arestas são muito mais intuitivos que nos softwares acima, disponibilizando várias informações em painéis que ficam o tempo todo visíveis para os usuários, evitando termos de acessar uma quantidade enorme de menus que dificultam replicarmos os procedimentos técnicos de análise quando algum tempo se usar o software.

Fiz algumas experiências com base nesse tutorial inicial que replico abaixo e realmente me pareceu que o Gephi pode poupar algumas boas horas de práticas em cima da análise de redes. Enfim, documentando por aqui para os interessados nessa imersão "sedutora" da modelagem de sistemas e análise baseada na metáfora dos grafos. :-)



quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Ouvi dizer que me acusaram



Ouvi dizer que me acusaram de tentar destruir instituições;

Mas, de fato, não sou favorável nem contrário as instituições,

(Que tenho em comum com elas? ou com a sua destruição?);

Desejo apenas estabelecer em Manhattan e em todas as cidades destes Estados, no interior, no litoral,

E nos campos e nos bosques, e nas quilhas pequenas ou grandes que chanfram as águas,

Sem edifícios, ou regras, ou curadores, ou qualquer argumento,

A preciosa instituição do amor entre camaradas.
 
Walt Whitman

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Anotações sobre o papel da mediação nos movimentos de rede

       Movimentos que se propõe a formar redes podem ser vistos como movimentos que instauram e fazem girar o que vamos chamar aqui de zonas de intencionalidades. De que intencionalidades estamos falando?  Sem dúvida, de várias, múltiplas, ora congruentes, ora difusas, divergentes, sintéticas e em contínuo movimento enquanto surgirem novos enlaces e novos nós em conexão. Vejamos algumas.
    Há uma intencionalidade fundamental e que vai influenciar de forma determinante, porém não excludente, o contexto, a borda, o campo daquilo que se propõe a colocar em rede, ou seja, daquilo que se pretende que a rede gire e produza em seus enlaces de conectividade. Intencionalidade essa que, muitas vezes, é pouca clara, pouco falada, pouco visível mesmo para aqueles que se propõe a operá-la e acreditam que a determinam. Essa intencionalidade instaura, mesmo que em casos extremos e de um modo difuso a partir de um explícito não-lugar, um convite de relação. Vemos nesse convite que constrói a intencionalidade a conexão por temas de interesse, desejos de agrupamento, articulação, movimentos de rede que se propõe a algo.
    Mas há outras inúmeras intencionalidades que atuam e entrecruzam esse convite inicial. Falamos aqui das intencionalidades de quem responde a esse convite e se sente impelido a se tornar um nó na malha de conexões, buscando deslocá-las segundo seus próprios interesses, sejam eles congruentes ou divergentes entre si em determinados momentos, em determinadas instâncias de existência da própria rede.
    É essa zona de intencionalidades definida pelos movimentos de rede que, ao mesmo tempo, define a própria rede. Logo, observando desse lugar em que nos propomos a olhar, essa zona é um campo de cuidado e de atenção. Cuidado no sentido de que é nesse campo que podem surgir a explicitação de pressupostos, modos de ver o mundo, entendimentos senso-comum pelos quais nos definimos, valores a serem defendidos, disputados, desejados, rejeitados, definições, variabilidades de discurso que podem mesmo chegar a redefinir as próprias bordas da rede, levando a outros níveis de entendimento de nossas próprias intencionalidades. Atenção no sentido de que nesse campo surge uma possibilidade de atuação, de um espaço de trabalho que se permite a operar a partir das múltiplas intencionalidades como um elemento que instaura uma nova intencionalidade: ser caminho de passagem, elemento de reflexão e conexão das diferenças e semelhanças. É a partir desse cuidado e dessa atenção que nos propomos a construir o lugar do mediador e a função da mediação em movimentos de rede.
   
“A mediação seria o processo de criação de elos entre dois agentes constituindo um composto híbrido que não existia antes e que desloca os objetivos, funções e intenções previamente estabelecidos” (Bruno, 2010). 

“Um mediador não é uma causa, nem um efeito ou mero intermediário entre dois pólos definidos de antemão. Ele é um operador de diferenças, de desvios, de deslocamentos que redefine os termos postos em relação – o indivíduo e a tarefa, o sujeito e o seu mundo interno ou externo” (Bruno, 2010).

“O mediador de relações sociais pressupõe, além de afinidade ideológica com a proposta de intervenção, que ele tenha sensibilidade e disponibilidade interior para aguçar a escuta, e maturidade suficiente para extrair da experiência vivencial o material de que precisa para problematizar os temas da vida social que nos grupos se estampam. Desempenhar bem essa função exige também que essa pessoa esteja mobilizada para entender e querer transformar as relações que, na sociedade competitiva em que vivemos, aprendemos a estabelecer com diferentes tipos de autoridade” (Lima, 2009).

“Orientados pelo princípio da co-gestão, os indivíduos que assumem a função de mediadores das relações sociais dos grupos sabem disso (referindo-se ao papel dos líderes e hierarquia). Por isso não ocupam o papel burocrático de apaziguar as tensões cotidianas, como forma disfarçada de salvaguardar as hierarquias. Não são conciliadores, nem fazem acordos para evitar conflitos que venham desestabilizar o controle da situação” (Lima, 2009).

    No movimento por dentro da zona das intencionalidades, o mediador atua favorecendo a visibilidade as diferenças e semelhanças, acirrando contradições e produção de comum, tornando o híbrido método e forma de passagem por entre a diversidade de discursos e enunciados em circulação. É desse lugar que o mediador não se preocupa se há muita ou pouca conversa, se a conversa é tensa ou apenas “adequada”. O mediador opera a partir do que brota, ele opera a partir do desejo de conversa alheio e não com a intencionalidade de produzir apenas mais conversa, imaginando aqui que a quantidade define a qualidade do movimento. Mas, há um outro ponto ainda no campo das intencionalidades que surge nas anotações acima e que demanda um pouco mais de atenção: a afinidade ideológica com a proposta de intervenção.
    O mediador não é um animador, um mero provocador de conversas que tenta falar de um lugar neutro, residindo na inconsistência da completa falta de intencionalidade. Não. O mediador age e age de algum lugar. Que lugar é esse? Voltamos aqui a intencionalidade do próprio movimento que se propõe a produzir redes. Que movimento é esse? Que características possui? Que associações estabelece? Que perspectivas de sociedade, de mundo e de modos de relação lhe definem? Saber disso e, acima de tudo, se posicionar em relação a isso é condição de base do trabalho do mediador que se pensa do lugar do cuidado e da atenção a zona das intencionalidades. Afinal de contas, o mediador está serviço exatamente do quê mesmo?
                   
Referências:
   1. Teoria ator-rede e psicologia. Prefácio. Fabiana Bruno, 2010.
   2. Educação pelos meios de comunicação ou produção coletiva de comunicação na perspectiva da educomunicação. Grácia Lopes Lima. 2009.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Conversando sobre Design colaborativo e dispositivos móveis como meios de intervenção social no I Congresso de Extensão Universitária da Unifesp

Desde os tempos de estudante universitário que escuto falar que uma universidade de qualidade, pública e gratuita deveria ser feita de três eixos fundamentais: pesquisa, ensino e extensão. A pesquisa e o ensino são elementos que têm me sido bastante próximos nos últimos, mas a extensão universitária era algo que de fato nunca tinha me colocado para pensar sobre e analisar seus efeitos, impactos e possíveis modos de trabalho quando envolve de fato professores, alunos, trabalhadores em geral e a própria comunidade onde o objeto de extensão surge como desenho e contorno de prática.

Ocorre que desde o começo desse ano estamos numa boa parceria com o núcleo Educação, Tecnologia e Cultura da Universidade Federal de São Carlos no contexto do projeto +Telecentros. Uma preocupação central desse espaço é trabalhar a questão da extensão como um elemento de articulação entre o que é produzido na universidade e o que é experenciado na relação com a sociedade. Questões de fundo interessantes, mas, sobretudo, modos de envolver alunos de graduação e pós-graduação que fazem muito sentido quando pensamos que a Universidade poderia ser um amplo de espaço de debate e experiência de outros modos de produzir uma sociedade.

O envolvimento do aluno é algo que tem me surpreendido. O impacto que as reuniões trazem, as reflexões que eles se fazem entre o que rola na sala de aula e o que vivenciam no ambiente de implementação de um projeto em uma política pública federal, os efeitos que isso vai acarretando em seu modo de entender seu papel, de como questionar esse mesmo papel.

A convite dos professores de lá, preparamos um material para apresentar no I Congresso de Extensão Universitária promovido pela Unifesp aqui em São Paulo. Fui eu e Felipe Cabral apresentarmos o trabalho que estamos desenvolvendo na área de Web para o projeto na parte da manhã, Felipe e Gus Gannan apresentando a parte de dispositivos móveis na período da tarde.

Conversa boa por lá. O ponto em que nos posicionamos era olharmos para a forma como produzimos um site, seja ele uma rede, um ambiente de divulgação de informação, agregação ou o uso que quisermos dar, como um meio fundamental de discutirmos as próprias apostas de como entendemos que um projeto deve funcionar, como ele deve operar e que impactos a organização da informação desse projeto causa na maneira como entendemos o próprio projeto. Produzir um site é menos uma técnica ou o desenvolvimento de um produto, sendo muito mais, neste caso, uma oportunidade de abrirmos diálogos que nos organizem e facilitem refletirmos sobre o que fazemos, como fazemos e como nos vemos uns aos outros.  A conversa impactou algumas pessoas, trazendo questões interessantes sobre como articulamos esse trabalho em relação aos próprios caminhos de pesquisa da Universidade, suas formas de aprofundamento, documentação e efeitos em toda a comunidade acadêmica. Enfim, novos sentidos ganhando corpo para nós ali, em ato e presença.

Outro ponto forte da conversa, que nem sempre é um ponto trivial por aí afora, foi debatermos que não acreditamos numa cisão entre o que chamamos tradicionalmente de "equipe de tecnologia" e aqueles que operam os sentidos e caminhos de um projeto. Essa cisão tem a tendência de alienar investimentos emocionais e técnicos que poderiam estar a favor de uma melhor compreensão de como nos comunicamos e de como operamos enquanto grupo no espaço e na posição de gerir um projeto de forma coletiva. Conversa forte, abrindo espaços para questionarmos vários pontos de tensão que brotam em nossas relações de dia-a-dia: hierarquia, posições de poder, circulação de fluxos de informação e por aí vai.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Acessibilidade e padrões na web: uma questão de liberdade



O que mais pega por aqui não é a falta de padrões, é o olhar que brota de uma cultura onde o interesse tá na difusão de massa, no controle e no protagonismo.

A tecnologia já existe, mas o que falta mesmo para operarmos isso em nossas ações?

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Apresentando sobre dinâmica de evolução de revistas científicas e bibliotecas digitais no 3º Simpósio Brasileiro de Comunicação Científica na Universidade Federal de Santa Catarina

Semana passada estive na Universidade Federal de Santa Catarina, no campus de Florianópolis, para participar do 3º Simpósio Brasileiro de Comunicação Científica. O evento faz parte das ações de pesquisa do programa de pós-graduação em Ciência da Informação e trouxe como temática do encontro a questão do acesso aberto.

Tema bom de conversar e ainda com muito, mas muito para ser feito em termos de tecnologia, pesquisa e, sobretudo, entendimento humano do assunto. Como tenho feito já a um tempo, estou participando de eventos desse tipo, enviando trabalhos do doutorado, como estratégia para conhecer melhor a área da CI no Brasil, o que tem sido feito, quem está atuando e construir melhores formas de me inserir também nesse contexto.


Alguns bons temas foram discutidos por lá nos dois dias do evento. Vou resumir aqui o que considero como as principais contribuições para o debate e onde acho que temos bastante espaço para experimentar bons processos de relação:



  • Banco Mundial e Unesco agora possuem diretrizes institucionais de promoção a seus repositórios em acesso aberto, seguindo os padrões da OAI.
  • A União Européia finalizou recentemente um projeto chamado PEER - Publishing and the ecology of european research. O projeto se propunha a investigar os efeitos causados pela publicação sistemática de artigos científicos revisados pelos pares do ponto de vista dos leitores, dos journals assim como em toda a ecologia da pesquisa na união européia. Diversos materiais interessantes foram gerados ao longo de 4 anos de trabalho.
  • Pesquisadores americanos têm criado alguns manifestos sobre a abertura integral e de acesso aberto aos resultados das pesquisas que foram financiadas pelo governo. Bom debate rolando aqui.
  • Para novos processos, novos modos de dar visibilidade sempre são uma etapa que ajudam e muito a conseguirmos avança na consolidação de novas ideias. A PLOS (Public Library of Science) tem se proposto a construir e experimentar novos indicadores que busquem avançar nas limitações de avaliação que hoje existem quando utilizamos apenas o fator de impacto. O Article level metrics é uma iniciativa fundamental para esse debate. A ideia aqui por detrás é mostrar como temos a necessidade de trabalhar de forma multidimensional para construir sistemas de avaliação de impacto que expandam as nossas limitações de olhar do que é hoje considerado uma boa pesquisa científica. Trabalham com as seguintes dimensões e suas possíveis integrações: usage, citations, social bookmarking and dissemination activity, media and blog coverage, discussion activity and ratings.
  • O projeto total-impact.org é uma iniciativa que permite criarmos uma coleção de objetos de pesquisa que desejamos rastrear e avaliar ao mesmo seu impacto na comunidade acadêmica. Permite criar coleções de artigos, dados, gráficos, entre outros e avaliar como eles são apropriados em diferentes dimensões. Muito útil.
  • Um livro interessante sobre os "novos colégios invisíveis" foi comentando como uma boa tentativa de mostrar como a ciência, a dinâmica da pesquisa e os fluxos de redes têm mudado nos últimos anos no mundo todo. 
  • Nas apresentações de trabalho, deu para sentir as primeiras conversas sobre curadoria digital de dados, sobretudo num projeto que foi ali apresentado, do Digital Curation Centre. É um projeto do Governo inglês que visa auxiliar suas universidades e instituições de pesquisa a promoverem processos de curadoria de seus dados digitais, ou seja, arquivarem dados brutos de pesquisa e não somente aqueles que já foram processados e se tornaram relatórios, artigos ou outros tipos de trabalhos. Outro debate fundamental: onde publicar os dados brutos da minha pesquisa? O quanto eles não poderiam alimentar de ideias e possibilidades de experimentação outros pesquisadores que tivessem interesses semelhantes aos meus? O quanto isso não poderia favorecer a melhor circulação de nossas próprias ideias?
  • Sobre ferramentas, duas delas foram bem lembradas para análise de padrões complexos em dados de produção científica: Citespace e Sci2.

 Abaixo, segue a apresentação que fiz no Simpósio e o link do artigo apresentado.




E no final, até um show Hare Krishna com distribuição de comida vegana rolou! Bom encontro!



terça-feira, 5 de junho de 2012

Apresentando sobre Open Archives no 9th CONTECSI International Conference on Information Systems and Technology Management

Semana passada fui apresentar um trabalho sobre o doutorado na 9th CONTECSI, que é um evento científico organizado pela Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo.

O evento já é um dos tradicionais aqui no Brasil voltado para discussões envolvendo as várias facetas de sistemas de informação, desde tecnologia até modos de uso e sentidos de apropriação. Confesso que fui bastante despreocupado em relação ao que esperar. Assim, normalmente, é mais fácil.

Resolvi passar a quinta-feira por lá. Apresentei meu trabalho logo após o almoço. Estava inscrito na área de Ciência da Informação, junto com outros trabalhos sobre repositórios digitais e interfaces da Ciência da informação com outras áreas do conhecimento. Os trabalhos na sessão em que apresentei eram bastante heterogêneos, sendo um primeiro focado na tecnologia de base do protocolo OAI-PMH, que também utilizo como um dos fundamentos tecnológicos do que viabiliza minha tese no sentido de transporte e circulação de metadados e um outro trabalho de cunho bastante teórico, mais voltado para pensar nos múltiplos usos que conceitos das ciências cognitivas fazem interface com a ciência da informação e formas de mapeamento dessas conexões. Por fim, tinha meu trabalho, sendo as primeiras reflexões mais aplicadas da minha tese, buscando mostrar como bibliotecas digitais federadas podem criar importantes e expressivos repositórios de informação que viabilizam pesquisas na área da bibliometria, infometria e webometria em outro nível de escala e qualidade. Temas interessantes, mas com pouco contato. Não houve muito debate e seguimos adiante. De qualquer forma, deixo aqui abaixo o material que apresentei por lá e que já começa a levantar alguns resultados iniciais de por onde ando pesquisando nos últimos tempos...




Depois, fui convidado para moderar uma mesa com o tema "Gestão de Sistemas de Informação". Enfim, tava esperando algo mais abstrato ainda, dado que nesse tema muita coisa poderia caber. Mas, me surpreendi, de fato. Pessoas bastante interessantes acabaram reunidas na sala, com trabalhos que abriram boas conversas entre si e bons caminhos de reflexão sobre modos de uso da informação, modelagem de dados, mineração e o uso da teoria de agentes de software para o gerenciamento de eventos em ambientes complexos, um dos temas que gosto bastante desde a época da Unicamp. A discussão que mais pegou foi sobre modelagem conceitual de banco de dados, dados multidimensionais e o famoso problema do minimundo.

O que modelamos é a realidade, o que vemos ou algum tipo de interface no meio disso tudo? E quando isso vira sistema de informação? Como garantir que funcione, seja flexível e ainda assim estruturado? Que dilemas precisamos cuidar? Interessante demais ver como gente bastante focada na ciência da computação em seu aspecto mais duro tem tentado responder a essas coisas. O foco vem e vai e acabamos voltados para os espaços de conversação e as múltiplas formas como surgem o pensamento humano. Divertido e bom pra pensar.

Bons trabalhos sobre BI e mineração de dados, uma área que tenho flertado mais nos últimos tempos, sobretudo pela possibilidade e potencialidade que oferece na síntese e visualização de informação complexa, ainda mais quando utilizado em conjunto com a análise de redes sociais.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Federações de sistemas de informações como de governança eletrônica

Assista "Towards Open Metadata Management: promo video of the ADMS-enabled federation on Joinup" no YouTube

Sem dúvida passos técnicos como esses não andam sozinhos. O mais importante por trás disso é a enorme oportunidade de encontro entre pessoas para falarem de suas visões de mundo e definirem maneiras de conversarem por esses protocolos.

sábado, 19 de maio de 2012

Quando os menus do Moodle param de funcionar, o que fazer?

Estou administrando desde o final do ano passado um sistema Moodle na Fatec Ipiranga. A ideia do sistema é servir como um repositório de conteúdo do material que os professores utilizam em sala de aula, gerenciar o lançamento de notas, faltas e servir como um espaço para que os alunos possam trocar mensagens, links, blogar e gerenciar um pouco melhor sua vida acadêmica.


Já tenho trabalhado com Moodle desde 2005, quando participei do projeto Pangea em sua proposta de formação para conselheiros de conselhos municipais do trabalho. Projeto inicial, Moodle ainda bem embrionário e muita coisa mudou no Moodle e na Internet desde então.

Ocorre que nesse ano estamos trabalhando com o Moodle versão 2, ou seja, com todas as novas funcionalidades e recursos que essa nova série do sistema tem para oferecer. Porém, nem tudo é simples...

De uns 10 dias pra cá, o Moodle simplesmente começou a não permitir que abríssemos seus menus em javascript. O sistema parou de permitir que os usuários acessassem seus conteúdos.

Pesquisando, pesquisando, pesquisando... achei algumas recomendações que queria deixar documentando por aqui, pois outros devem passar pelo mesmo problema e o susto é razoável.

O Moodle gera um cache de várias funcionalidades: html, javascript, dados dinâmicos e outras coisinhas do sistema. Esse cache fica no servidor e vai chegando num nível que ele não consegue gerenciar direito. Logo, o sistema precisa limpar o próprio cache, porém, ele não sabe disso até que você informe.

Logo, o Moodle disponibiliza um script em php que fica nesse endereço: http://yourdomain.com/admin/purgecaches.php

Esse script limpa tudo o que estiver em cache no servidor, fazendo com que todas as novas funcionalidades tenham de ser carregadas novamente para o cliente. Isso traz as funções do sistema de volta ao seu modo padrão.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

O valor e a escala de crescimento das redes: leis de Metcalfe e Reed

Lendo a revista Wired essa semana, na entrevista de Marc Andreensen, ele trouxe a tona duas "leis" que tentam dar conta de projetar o valor das redes e o modo como elas se organizam por comunidades. O ponto em comum dessas duas formas de olhar para redes é que elas falam de fenômenos ligados ao crescimento delas, ou seja, quando mais nós e mais links começam a fazer parte de uma estrutura algo ocorre.

Esse algo tem a ver com o modo de valorar redes e o modo de enxergar a formação de subgrupos.

A lei de Metcalfe

Metcalfe é um dos pioneiros da Internet, tendo sido o inventor do padrão Ethernet de comunicação de redes locais.
A sua ideia, extraído da Wikipedia, diz o seguinte:

"O valor de um sistema de comunicação cresce na razão do quadrado do número de usuários do sistema."



\frac{n(n-1)}{2}

Bem, isso pode significar muitas coisas sob vários pontos de vista. Porém, basicamente, pra mim significa que quanto mais gente conectada, quanto mais dispositivos articulados, maior o valor de uma estrutura de rede. Além disso, esse valor cresce no quadro do número de nós em articulação. O quadrado aqui tem um efeito de criar um escalonamento que é diferente do crescimento linear, mostrando que mais nós representa mais possibilidades de combinação que crescem proporcionalmente ao quadrado.

As redes geram valor. Isso é algo difícil de discordar. Geram troca de informação, geram articulação de pessoas, geram possibilidade de produção de conhecimento, geram capacidade de novos caminhos de conversa, geram muitos modos de combinação entre pessoas e dispositivos técnicos que têm servido de base para o que temos conhecido como as melhores e mais interessantes inovações que temos produzido nos últimos anos.

Isso vale e pode ser aplicado em muitos casos. Vale para projetos, para modos de articulação social, para modos de ativismo, para modos de relacionamento em geral. Geramos valor em nossas articulações. Como entendemos o que é valor, aí, vai depender do teu olhar, daquilo que lhe convoca, do que lhe chama atenção.

Valor nem sempre é $, nem sempre é poder de dominação. Qual a unidade de valor que poderíamos utilizar aqui? Reais, amigos, articulação, influência, apoio, colaboração, ajuda? Que mais?

O fato que me interessa aqui: redes geram valores e esse valor depende unicamente do contexto onde a rede opera como modo de organização da relação entre pessoas.


A lei de Reed

Já a lei de Reed diz do número possível de subgrupos que podem ser formados dentro de uma rede.  Reed, também um dos pioneiros da Internet, trabalhou na criação do TCP/IP e foi o designer do protocolo UDP.

Segundo ele, o número de subgrupos que surgem dentro de uma rede também depende do número de nós presentes na rede a uma escala que evolui exponencialmente com o número de nós: 2N − N − 1.


Pra mim, isso tem uma perspectiva bem interessante quando conseguimos observar que quanto mais gente atuando numa rede maior é a tendência dessas pessoas se organizarem em subgrupos que tenham e definam focos mais específicos de ação. Ao que tudo indica, parece esse um fenômeno bastante peculiar das redes sociais e do modo de organização que nos pautamos socialmente quando atuamos nessas redes.

Essas duas leis podem ser utilizadas de modo articulado para projetarmos análises, projetos, escalabilidade e funcionalidades em sistemas colaborativos. Estou falando de modos de fazer design de redes. Conhecer e estudar algumas das possibilidades de como as redes evoluem no tempo pode nos deixar mais atentos, mais conectados e ligados em condições de contorno que podem facilitar a conversa, facilitar o fluxo e liberar energia criativa para outros tantos meios de recombinação de imaginários.



quarta-feira, 16 de maio de 2012

A Internet que queremos ou dos processos de concepção de um site


A Internet é uma rede de múltiplas camadas, de múltiplos níveis de tecnologias que dialogam entre si e criam um cenário de interoperabilidade de sistemas que permite possibilidades de comunicação e interação entre pessoas como nenhuma outra tecnologia antes sequer imaginou realizar. Ao permitir múltiplas camadas, a rede cria condições para que muitos modos de entender e produzir redes possam conviver. O comércio com suas necessidades de novas estruturas de venda e circulação de produtos, a indústria com sua necessidade de novos modos de produzir gestão ágil e descentralizada sem perder o controle de seus meios de produção, o governo com suas demandas de presença e manifestação em diversos territórios, sejam eles físicos ou imateriais, por onde sua regulação exerce efeitos e determina as regras dos jogos de convivência burocrática, os movimentos ativistas com a necessidade de divulgação de suas causas e de articulação de pessoas.

A Internet é rede de redes, é tecnologia que viabiliza circulação e dispersão de fluxos e, ao mesmo tempo, controle desses mesmos fluxos. É campo de apropriação e exercício de produzir formas de relação que façam sentido às demandas e necessidades de diferentes modos de organização social que podem ser produzidas pelas pessoas. É campo de influência, tecido de escritas de diferentes versões dos fatos, disputando espaços, colaborando em ações, dissolvendo fronteiras e produzindo limites. É massa de moldar zonas de interferência e produzir espaços que auxiliem na construção de sentidos restritos ou coletivos, sempre dependendo do olhar de quem vê e do modo como se relaciona.
Partindo dessa visão, a produção de um site, assim como seu próprio processo de concepção, é um ato de escrita, um ato de afirmação de valores que ultrapassam os limites dos dizeres técnicos e tecnicistas. A produção de um site é um evento político, entendendo por política a arte ou ciência da organização que pretende reger e regulamentar as formas de relação possíveis e imagináveis no contexto onde esse site irá operar. Por isso, ato de escrita, ato de atestação de valores, parâmetros e princípios de um grupo. Nesse caminho, a construção do site envolve necessariamente discutirmos a rede que queremos, a internet que desejamos refletir e os modos de organização que ampliem, sistematizem e facilitem as formas de relação que desejamos aqui constituir.
Sendo, portanto, o site o reflexo de um conjunto de princípios que ditam modos de fazermos redes, gostaríamos de aqui descrever esses modos e como eles têm influenciado em nosso processo de concepção do site do programa +Telecentros.

  1. A rede é espaço de encontro:
    A rede é espaço de aproximação entre pessoas, é local de encontro, é espaço onde o imaginário habita quando o contexto convoca e a presença é possível. É local onde encontrar a presença alheia amplia possibilidades de interação.
  1. A rede é espaço de conversa:
    A rede é espaço de conversação, de trocas de impressões, de compartilhamento de sentidos, de construção em andamento contínuo, do inacabado que se torna elemento de diálogo, de troca de impressões e de produção coletiva. A rede é ambiente e caminho onde as impressões se recombinam e dissolvem, entremeadas de links, pontos de contato e divergência.
  1. A rede é espaço de versões:
    A rede é espaço de diferentes visões e versões do que se encontra em produção. Como dissemos acima, é espaço do inacabado, é espaço de anotações, de retalhos de ideias e possibilidades de ideias. É local para documentar o que convoca a escrita, o que mobiliza o sentido sem a necessária preocupação de apresentar sentidos acabados. Sendo espaço de infinitas possibilidades de combinação, disponibilizar versões na rede é aumentar as chances de encontro com o outro quando um filtro de busca cria os enlaces e viabiliza novos vínculos.
  1. A rede é espaço de conflito:
    A rede é também espaço de desencontros. É espaço de explicitação de valores, de definição de campos que desejam criar marcas, que desejam dizer de limites, que desejam expressar discordâncias e mostrar que outros modos são possíveis. A rede é também máquina de articulação de opostos, de força vibratória que tensiona e distende nós de sentido.
  1. A rede chega até você:
    A rede não é feita de computadores, mas sim de pessoas. As máquinas, os protocolos e programas de computadores criam o campo de interconectividade e interoperabilidade de sistemas, permitindo que diversas tendências da indústria em termos de tecnologia e modos de produção econômica possam trocar informações e compartilharem dados. No entanto, a rede estabelece links pelos desejos das pessoas, a rede expressa em seus nós, em seus movimentos de centralidade e descentralização os modos como as pessoas se recombinam em grupos, comunidades e movimentos de expressão. A rede é articulada pelos e-mails, pelos links das redes sociais, pelos sms de telefones móveis, pelos encontros em espaços de formação, pelas vozes em seus múltiplos meios de expressão.
  1. A rede é livre:
    A rede não pode ser condicionada por nenhuma estrutura organizacional que pretenda definir seus rumos dado que ela é composta de pessoas. A hierarquia organizacional influencia a forma das redes, mas estas lhe escapam, criando novos vínculos, se apropriando de novos espaços de conversa onde sejam menos vigiadas. A hierarquia nas redes livres é nó de influência, mas não define centro e o tom dos fluxos em circulação. A hierarquia dialoga, circula e opera a partir de novas condições de conversa que se viabilizam na construção de sentido coletiva. A velha hierarquia sufoca as redes livres, eliminando o que a rede possui como condição fundamental de ser rede: as novas condições de possibilidades e combinações que sua estrutura permite.
  1. A rede é espaço político:
    A rede guia e é guiada, a rede influencia e é influenciada, a rede promove e é promovida. A rede, enquanto modo de organização de pessoas, define um campo político, define regras, condições, formas de relação que buscam viabilizar condições de relacionamento entre pessoas. A forma como a rede opera explicita suas escolhas como política relacional, o que lhe é permitido e o que lhe é negado.
Esses sete princípios definem desejos e condições que influenciam o modo como um pode ser concebido. Porém, são princípios que extrapolam os limites do próprio site, apontando para modos de produção de redes que buscam construir redes livres, abrindo brechas de expressão, espaços de conversa e novos caminhos que só podem surgir quando as regras do campo surgem da inteligência coletiva, bem ali onde a multidão forma bando e os burburinhos tecem diálogos em meio a produção de um novo modo comum. 

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Análise de redes sociais e sistemas observantes: novos modos de olhar para os sistemas sociais

Fui convidado para fazer uma conversa/aula ontem a noite sobre analise de redes sociais pelo amigo e companheiro de jornada Luiz Algarra, la no curso de Design de fluxos de conversaçao que ele e Gil Giardelli estao ministrando na ESPM.

A pegada que o Algarra ta propondo no curso e´ um passeio pelos conceitos do Humberto Maturana aplicados nas relaçoes humanas no que consiste fazer redes e sua relaçao com os sistemas sociais humanos. Angustia geral, dado que vivemos tempos onde todo mundo esta buscando as ultimas tendencias nas redes sociais, as ultimas oportunidades, as ultimas tecnologias, os melhores indicadores e como surfar ondas de viralizaçao e contagio social buscando atingir "bons" resultados nas redes.

Acontece, que as coisas pensadas dessa maneira transformam as redes humanas em objetos que podem ser controlados pela melhor estrategia ou metodologia da vez. De fato, as coisas parecem nao funcionar assim, mesmo que continuemos tentando, buscando formas e modos de obter os resultados que queremos.

As organizaçoes humanas sao muito mais complexas do que nosso modo tradicional de pensar pode lidar. Elas tratam diretamente do querer das pessoas, de seus modos de ver o mundo, de suas maneiras de se colocar, de sua historia, de suas perspectivas e de suas continuas escolhas. A unica forma de encontrarmos caminho por entre esse universo de complexidade e´ conversando sobre isso, criando pontos de contato, verdadeiros pontos de um do-in atropologico, onde as pessoas possam se manifestar, se olhar, entender diferentes pontos de vista e consigam construir novas interpretaçoes e elaboraçoes daquilo que lhes incomoda, o que lhes convoca a açao e o que lhes chama atençao.

As metodologias, os mapas, os indicadores e as tecnologias em geral tem um papel importante nisso tudo, sem duvida. Sao ferramentas de trabalho, mas nao podem se tornar o foco da açao. Sao instrumentos que podemos lançar mao, vez ou outra, para facilitar aberturas de conversa, para facilitar visualizarmos aquilo que estamos construindo juntos, para dar possibilidade de fazermos um design coletivo naquilo que a partir de entao conseguimos visualizar. No entanto, muitas pessoas estao entendendo as metodologias e ferramentas como se fossem a resposta que precisam para seus problemas, gastando seu tempo e recursos tentando adapta-las ao seu contexto e tentando obter resultados que outros obtiveram, mesmo que tenham vivenciado mundos muito diferentes.

Nesse sentido, as coisas sao mais simples do que parecem. No centro, as pessoas, em torno, multiplas formas e modos de conversarmos, auxiliados por diferentes tecnicas, ferramentas e representaçoes. Escolher por entre elas depende daquilo que queremos em conjunto e, sobretudo, depende de conseguirmos conversar sobre isso.

Deixo aqui o material que preparei para o encontro de ontem, que acabei de fato nem utilizando com o pessoal. Mas, foi fundamental para abrir a conversa e construir um espaço de contato.


sexta-feira, 27 de abril de 2012

O mágico, o matemático e o engenheiro

Quando mágico, desapareço nexo e inverto sentido
Aparento ritmo, escalando por entre respiros
Vizinhando o toque do espanto, reflexo de luz repentina
Inventando rima, sigo assim, procurando o efeito do momento sutil.

Mas o que surge, por entre o passe da mão, é a forma
Ondulando espaço, triangulando círculos repentinos num vértice contínuo.
Mais de mim que surpreende, mas por onde?
Quando viu, foi pra lá o que era daqui.

No reverso, surge fórmula, tangente ditando norte
O homem que a escreve espreita incerteza
Surpresa de escuta, quando palavra rompe
Reinventando um novo rumo, caminho trançado de eixos.

Estrutura, dizem dali, rigor traçado de espelhos
Retinando bolhas, vapores concretos em sínteses de si
Mas, o espaço não cessa e nem interrompe momento
Se abre tela, desenho de uma verdade fundada assim.




quinta-feira, 26 de abril de 2012

Contorno de um movimento ali

Um velho pisca de relance na virada de um passo qualquer
Paro de retorno, olhando de lado
Mas não vejo nada o que em mim viu.

Vejo um outro olho, marcado de rumores de vento
Sentidos disparados e plantados num traço de amarelo
Contraste de traça, de caminho por entre palavras
Moídas num canto de página como se verdade é o que se diz.

Mas, é ali que acho uma pista, um contorno,
Um meio termo de brecha, uma abertura esquecida,
Palavra que pego, guardo entre braços abertos
Atento ao ponto em que lanço, giro e paro....

... observando o que se move, anotando tudo
num traço de pele, numa gota de suor corrido
que se lança em meio a um passo a um certo meio fio
registrando um contato de primeiro grau subvertendo a ordem em vias públicas.



sábado, 14 de abril de 2012

As linguagens da psicose e modos de modelar redes linguísticas

O insight de que as redes de conversação humana formam sistemas complexos que podem ser estudados da perspectiva da linguagem que geram não é uma novidade. Tenho visto estudo sobre issos já a algum tempo, envolvendo desde a turma da aprendizagem organizacional e biologia cultural até o pessoal mais voltado para análise complexa, caos e dinâmica de redes.

A linguagem é uma forma de expressão que carrega em sua própria concepção uma perspectiva estrutural bastante forte. A posição das palavras, seus papéis sintáticos e semânticos, as funções exercidas, enfim, um universo de conceitos que revelam estrutura na relação entre palavras. Estudar qualquer aspecto estrutural pela uso da análise estrutural e dinâmica de redes é algo que pode fluir com bastante facilidade. O uso da modelagem de dados por estruturas como grafos e as possibilidades de indicadores que geramos dessas técnicas tornam-se um recurso de pesquisa e experimentação fantástico para identificar tendências, padrões e aspectos que marquem as característica de uma estrutura.

Caracterizar estruturas não é um processo fácil, exato. Na verdade, ferramentas de descrição podem ajudar muito, mas um certo aspecto intuitivo é fundamental para dar relevância, filtro e sentido para aquilo que as análises mostram. Nada de novo, desde que estatística é estatística as coisas seguem mais ou menos desse modo.

Essa semana, recebi de um amigo um link de um artigo científico que fala de usos da análise de redes para identificação de padrões estruturais na linguagem de pessoas com psicose e manias. Os resultados são bastante simples e as imagens muito intuitivas, mostrando algumas formas estruturais que revelam diferentes modos de utilização da linguagem.

Um dos pontos mais importantes é pensarmos que esse uso, no caso direcionado mais para a área da saúde e casos clássicos, pode também ser direcionado para sistemas de conversação humano como um todo. Grupos de trabalho, redes sociais, comunidades, etc... formam sistemas linguísticos que reverberam estruturais de organização do que corre por dentro das veias do grupo. Sem dúvida, não é uma abordagem absoluta e num deve ser considerada única, mas é mais uma forma de espelhamento, de reflexão sobre aquilo mesmo que construímos em conjunto e que não se torna visível para quem não se questiona e busca analisar os próprios padrões de si.


A perspectiva da dobra é autoconhecimento, seja de si, seja de um grupo. Com que objetivo mesmo? :-)))