segunda-feira, 29 de agosto de 2011

A contradição está na mesa: de redes, inovação e como conversamos

O ano de 2011 está sendo repleto de contradições profundamente interessantes. Movimentos que parecem de vanguarda despontando, novas ideias, modos de pensar e modos atuar sinalizando novas condições possíveis para formas de viver que antes pareciam impossíveis. Por outro lado, movimentos fortemente retrógrados, autoritários expoentes de uma dor em transição que parece sinalizar que de fato muita coisa está mudando ao longe de onde nossas vistas parecem alcançar.

Sim, há cheiro de mudança, cheiro de algo sendo gestado no interior de fluxos intensos de conversa, algo como que sinalizando lá longe que nada de fato vai ficar como está. Sim, ventos de impermanência. Necessários quando nos agarramos a algo não nos dando conta de que o movimento é contínuo, mesmo que a ideia não peça atualização.

Trabalhar com Internet, com redes, com produção, pesquisa e análise do que vem ocorrendo nas redes tem me dado um lugar singular para observar esses movimentos todos. A rede é reflexo natural do que temos de mais humano: a capacidade de se relacionar e de conversar com o outro(s). Algumas experiências que tenho feito vão me trazendo novos modos de olhar para isso. Eis que venho me dando conta, cada vez mais, que há uma contradição enorme, explícita e posta à mensa em muitos processos que tenho observado. Eí-la:
  • temos cada vez mais informação disponível em nossos computadores, celulares, telecentros, lanhouses, etc, geradas por inúmeros sistemas que coletam dados, redes sociais, sensores, etc. Saber aproveitar essa informação de modo estratégico para a produção (inovação) de novos produtos, novos processos de trabalho, novos meios de interação/relação tem se tornado cada vez mais importante para grupos/organizações/ativistas/artistas. Ocorre que essa tipo de aproveitamento é complexo, exigindo cada vez mais que pessoas colaborem com pessoas. Logo, muitos estão em busca contínua de formas de controlar suas redes para que possam operar do modo como imaginam, colaborando da forma que imaginam para que isso possa trazer os resultados que imaginam;
  • quanto mais as pessoas/grupos buscam controlar, policiar, regrar, ditar o que deve ou não deve acontecer em suas redes, mais as redes acabam se esvaindo, mais acabam fornecendo respostas protocolares a pedidos que não são reconhecidos como legítimos e que acabam sendo tratados como mais uma forma de receber ordens/imposições/tarefas a serem feitas.
A contradição está na mesa! Com esse modo de pensar, há poucas saídas possíveis, até onde vejo. Se focamos no produto final como objetivo, mesmo que chamemos o produto final de um processo "livre", "colaborativo", "aberto", "inovação", mas de fato pouco preocupado nas relações e no cuidado com as relações, o que surge será sempre limitado as condições de contorno daquele que criou seu cercadinho em torno da rede. 

Mas, e daí? Para onde olhar? Desse modo, para onde vai a "potência" da rede?

Novamente, esse momento tem me dado algumas pistas fundamentais para observar e refletir mais sobre os movimentos que tenho vivenciado:
  1. o que o marketing/publicidade/agências/"ativistas" têm feito, em alguns casos, está de fato centrado na promoção de suas ideias, seus modos de pensar. São, de alguma maneira, rígidos. Suas ideias são acolhidas por grupos que concordam com seu modo de pensar e repelidos por aqueles que acabam adquirindo aversão a essas ideias. Suas ações acabam provocando sempre a sensação de lutarem a favor ou contra algo, sendo separatistas de algo e adeptos de algo. A conversa em espaços promovidos desse modo nunca é autêntica, surge como reflexto de desejos de se promover, de promover uma marca/ideia/produto/processo, levando as pessoas a estarem "armadas" de algum modo, sempre prontas a se defender, defender suas ideias e seus amigos. Sem solução!
  2. outros movimentos, ainda muito pequenos, parecem contar a história de outro modo totalmente diferente. Estão pouco preocupados em defender algum tipo de ideia, alguma forma/salvação de como fazer as coisas ou mesmo algum produto que precisa de algum modo ser promovido. São movimentos preocupados com a abertura necessária para se relacionar com o outro, buscando servir como espaço de transição/reflexo do outro, espelhando ideias, disponível, atento para conversar, criando dentro de si as condições mais inusitadas para ter condições de promover essa conversa em determinadas situações. A ideia a ser experimentada é a disponibilidade contínua de rever posições, papéis, estruturas, processos, normas, regras que não fizerem mais sentido, que engessam as relações e que precisam de um fórum contínuo para serem revisitadas todas as vezes que se fizerem necessárias. A rigidez é reduzida ao máximo possível, buscando identificar e ampliar todos os espaços "entre" que forem possíveis. É ali que se habita nesse movimento.
A própria ideia de trabalho está sendo questionada desse modo. A abertura a relação só pode surgir como fruto de movimento autêntico, legítimo de intencionalidades e disposição. O que é gerado desse movimento é consequência e não causa.

Ao continuar focando na causa, nos processos geradores de algo que queremos, mais nos afastamos do possível novo que está em nossa frente, fugidio, escorregadio, liso e jamais sob controle.

A abertura é condição fundamental para partir de qualquer ponto, de qualquer relação e construir um caminho possível que pode levar a algo, seja ele o que for. O exercício que supera de alguma forma a contradição é o puro desapego de alguma forma constante, legítima e verdadeira. Daí, podemos construir algo que pode nos levar a outros modos de relação....

Um comentário:

Isis Lima Soares disse...

Viva as boas composições, e a disponibilidade de fazer por inteiro! :)