quarta-feira, 9 de junho de 2010

A conservação das estruturas nos sistemas sociais

Independente do tipo de sistemas sociais que somos parte, dá para perceber uma característica que que é muito semelhante em todos eles: os sistemas criam maneiras de conservarem suas condutas ditas "apropriadas".

Sejam as condutas ditas "libertárias", ditas "conservadoras", centralizadas, abertas... A questão é que a partir do momento em que um sistema social se constitui, ele passa a operar de uma maneira que me parece naturalmente conservar as condutas que constituíram o próprio sistema. Sem dúvida, isso muda ao longo do tempo, pois as pessoas mudam, sua maneira de ver, usar a linguagem, a produção de sentido e de viabilidade de estarem no mundo muda.

Mas, a maneira como conservamos nossas condutas nos sistemas sociais que participamos não é algo tão evidente. Me parece ser um aspecto sutil, muitas vezes móvel, mutante e encoberto de justificativas de nossos próprios padrões de conservação. Às vezes, o que surge como algo em busca do novo, vira uma maneira de conservar uma certa conduta que se estabiliza num tipo de busca do novo e, por dentro disso, a própria busca do novo padece de outras maneiras de se ver o novo. Ou seja, o olhar vai ficando engessado, acostumado a olhar para algo de uma determinada forma, como se essa forma fosse a certa, a melhor, a maneira viável, possível...

A questão é que os sistemas sociais vão se estabilizando ao longo do tempo assim. Em determinados pontos, passam por crises, viram do avesso, seu próprio desejo de conservação de condutas passa a ser insuficiente para lhe garantir vida: o sistema perde sua capacidade organizacional e morre. É reinventado de outras maneiras, desaparece aqui e surge ali. E tudo gira.

Lendo um pouco sobre isso no "A ontologia da realidade" do Humberto Maturana, vi um trecho que achei especial. Maturana menciona duas maneiras que vê sobre como um sistema social cria condições de estabilizar sua própria organização e, assim, preservar sua condição de possibilidade de se manter como um sistema social:
  • à estabilidade pela consciência social, ao ampliar as instâncias reflexivas que permitem a cada membro uma conduta social que envolve como legítima a presença do outro como um igual; ou
  • à estabilidade na rigidez de condutas, por um lado, mediante a restrição das circunstâncias reflexivas, ao limitar os encontros fora do sistema social e reduzir a conversação e a crítica, e, por outro lado, mediante a negação do amor, ao substituir a ética (a aceitação do outro) pela hierarquia e a moralidade (a imposição de normas de conduta), ao institucionalizar relações contingentes de subordinação humana. 
Possibilidades visíveis em muitos dos sistemas que vivemos e fazemos parte, além de alimentar condutas que conservam esses níveis de estabilidade. Justificativas para rigidez, limitação e institucionalização de relações são fáceis de serem encontradas e, a primeira vista, parecem sedutoras e produtoras de um sentido de eficácia e escala nas relações.

Mas, não se trata disso. Se pensamos nas redes como sistemas sociais que podem propor uma ampliação de nosso potencial de liberdade, creio que estamos falando de processos que considerem a consciência social como meio de organização e estruturação dos sistemas. Ou seja, estamos falando aqui de ampliar espaços de conversação, espaços de criação de coletivos que se exercitam na escuta, na busca do entendimento e do encaminhamento de suas questões pela composição de diversas visões. É um exercício de linguagem, de visão, de ampliação de olhar.

Do contrário, caminhos que levam a rigidez e hierarquização parecem a única opção possível, mesmo mascarados em formas libertárias, sedutores e em discursos fáceis. O sutil não tá na aparência, tá no uso da linguagem, nas formas de relação e naquilo que é não dito.

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