Comecei no final de semana. Sábado de retiro e meditação. As páginas foram fazendo cada vez mais sentido quando contextualizado com tudo aquilo que venho pesquisando sobre redes sociais, sobre complexidade de sistemas e sobre pensamento complexo. Parecia incrível que estava ali, à disposição, tantas idéias fundantes e claras a respeito de como conhecemos, de como interagimos e de como nos relacionamos pela linguagem a partir de nossa estrutura biológica. Terminei hoje pela manhã o livro. Vindo trabalhar e me sentindo tocado por aquilo, como se fizesse um sentido ancestral e como se fosse necessário repensar todo o meu fazer no que toca as práticas e formas de atuar. Além do campo do trabalho, o campo da conversa, do agir e interagir em rede, do se relacionar em qualquer âmbito e espaço de interação. O desejo ficou de anotar algumas idéias chave por aqui para poder ir retomando e registrando a forma que vejo e sinto a respeito disso tudo.
Algumas idéias do livro:
- afirmamos que, no âmago das dificuldades do homem atual, está seu desconhecimento do conhecer. (pág. 270);
- cegos diante dessa transcendência de nossos atos, pretendemos que o mundo tenha um devir independente de nós, que justifique nossa irresponsabilidade por eles. Confundimos a imagem que buscamos projetar, o papel que representamos, com o ser que verdadeiramente construímos em nosso viver cotidiano (pág. 271);
- qualquer coisa que destrua ou limite a aceitação do outro, desde a competição até a posse da verdade, passando pela certeza ideológica, destrói ou limita o acontecimento do fenômeno social. Portanto, destrói também o ser humano, porque elimina o processo biológico que o gera. Não nos enganemos. (pág. 269);
- a esse ato de ampliar nosso domínio cognitivo reflexivo - que sempre implica uma experiência nova - , podemos chegar pelo raciocínio ou mais diretamente, porque alguma circunstância nos leva a ver o outro como um igual, um ato que habitualmente chamamos de amor. (pág. 268);
- se sabemos que nosso mundo é sempre o que construímos com os outros, cada vez que nos encontrarmos em contradição ou oposição com outro ser humano com qual desejamos conviver, nossa atitude não poderá ser reafirmar o que vemos do nosso próprio ponto de vista. Ela consistirá em apreciar que nosso ponto de vista é o resultado de um acoplamento estrutural no domínio experencial, tão válido quanto o de nosso oponente, mesmo que o dele nos pareça menos desejável. (pág. 267);
- o conhecimento do conhecimento obriga. Obriga-nos a assumir uma atitude de permanente vigília contra a tentação da certeza, a reconhecer que nossas certezas não são provas da verdade, como se o mundo que cada um vê fosse O mundo e não UM mundo que construímos juntamente com os outros. (pág. 267);
- a estrutura obriga. Por sermos humanos, somos inseparáveis da trama de acoplamentos estruturais tecida por nossa permanente "trofolaxe" linguística. A linguagem não foi inventada por um indivíduo sozinho na apreensão de um mundo externo. Portanto, ela não pode ser usada como ferramenta para a revelação desse mundo. Ao contrário, é dentro da própria linguagem que o ato de conhecer, na coordenação comportamental que é a linguagem, faz surgir um mundo. Percebemos um mútuo acoplamento linguístico, não porque a linguagem nos permita dizer o que somos, mas porque somos na linguagem, num contínuo ser nos mundos linguísticos e semânticos que geramos com os outros. Vemo-nos nesse acoplamento, não como a origem de uma referência nem em relação a uma origem, mas como um modo de contínua transformação no devir do mundo linguístico que construímos com os outros seres humanos. (pág. 257);
- a coerência e a estabilização da sociedade como unidade se produzirá, dessa vez, mediante os mecanismos tornados possíveis pelo funcionamento linguístico e sua ampliação na linguagem. Essa nova dimensão de coerência operacional é o que experimentamos como consciência e como "nossa" mente. (pág. 255).
Nossa autopoiesis cria camadas a partir do aumento de complexidade de nosso sistema neural. A linguagem surge como deriva desse aumento de complexidade. Na relação com outro, as múltiplas possibilidades do linguajear surgem e com elas a capacidade de reflexão. Surge a mente e a consciência como possibilidade complexa de conectividade de nosso sistema neural. A possibilidade de linguagem é derivada de acoplamentos estruturais no domínio semântico da forma como descrevemos nossas coerências operacionais. É uma camada abstrata que surge e que podemos interagir por ela (isso certamente tem a ver com a idéia de websemântica do Levy). Considerar o domínio cognitivo reflexivo do outro é expandir o próprio domínio, aumento o campo de complexidade em que podemos navegar e enxergar...
E o que isso tem a ver com as redes sociais? e com ativação das redes? Hummm.... Será? ;-)