terça-feira, 8 de junho de 2010

o falso problema da inovação

Inovação, criatividade e experimentação parecem ser cada vez mais o tom dos discursos nas redes, nos jornais, nos relatórios e nas conversas de quem tá refletindo sobre nossas tendências atuais, como nesse relatório que a IBM soltou recentemente.

Tenho preferido ver a questão de uma outra maneira. Acho que posicionar a conversa sobre esses pontos é acabar alimentando um ciclo de produção que pretende ser libertário mas que acaba fechado sobre as próprias fronteiras que acaba erguendo.

As fronteiras não surgem das organizações, nas instituições burocráticas ou mesmo das redes que fazemos ou não parte. As fronteiras surgem na linguagem: termos que definem e excluem, expressões que buscam registrar algo dinâmico e que dão conta de apenas relevar uma dimensão limitada e temporal do pensamento.

A busca por liberdade, se for esse o caso, está além das fronteiras da linguagem. Não é algo que vamos resolver criando mais redes, desenvolvendo tecnologia, salvando a natureza ou melhorando nossa capacidade de inovação, criatividade e tendo idéias mais interessantes para pesquisa e desenvolvimento.

A busca por liberdade está além do conceitual, do que pode ser expresso em significados. Está exatamente no dissolvência do significado, das perguntas que buscam uma resposta que só é encontrada quando já não há mais perguntas.

Parece algo paradoxal: como se nada do que efetivamente fizéssemos pudesse ampliar intrinsecamente nosso potencial de liberdade e a liberdade só realmente surgisse quando deixamos de buscá-la dessa maneira. Creio que parcialmente. Bordas podem ser ampliadas, compreensões alargadas, sistemas que passam a incluir variáveis que antes não eram consideradas, pessoas que se abrem para conversas quando antes estavam fechadas, começamos a considerar coisas que antes achávamos irrelevantes.

Sem dúvida, isso também tem um limite. Toda a complexidade não pode ser abarcada de uma forma plena, sempre algo estará de fora. Fazemos escolhas, escolhemos bordas, criamos fronteiras, nos associamos e nos separamos e fazemos isso como consequência da nossa própria maneira de nos relacionarmos e usarmos a linguagem que usamos.

Dessa maneira, buscar inovação, criatividade e experimentação como elementos fundantes de algo libertário, como se o que se dedicasse a outras coisas fossem apenas a conservação de um determinado status quo me parece um falso problema.

2 comentários:

felipefonseca disse...

se tu quer tomar as palavras só como descrição de uma compreensão das coisas, pode estar certo. mas tu também deve saber que palavras têm o papel de agregar, motivar, facilitar dinâmicas de comunicação, criar campo, inserir-se em contextos. tratar palavras só como acessórios da "prática", subordinadas a como as coisas são "na verdade" é jogar fora todo um potencial de fazer coisas acontecerem.
a ideia de "inovação" é realmente limitada, dependente de uma crença essencial no "progresso". mas a ideia da adaptação, de modificação das metáforas e das visões de mundo para poder influenciar melhor a realidade, não.
perguntar não é fazer?

Dalton Martins disse...

creio que as metáforas criam a realidade.
aquilo que conseguimos descrever é aquilo que conseguimos distinguir, portanto, passa a ser o mundo "real" que habitamos no espaço e no tempo.

ao construirmos nossas metáforas, criamos as mandalas por onde atuamos. são enlaces sem fim, mil platôs, talvez.

perguntar sem dúvida é fazer.
linguagem é ação.
mas, quando achamos que conteúdos nos descrevem, ou são melhores ou piores que outros, mais inovadores ou mais promissores, que nossa experimentação é menos ou mais burocrática... sob que condições? sob que critérios?

juntando o que vemos, vemos mais
longe.
juntando o que vemos, expandimos a linguagem e ela alcança mais compreensões.
juntando o que vemos, ampliamos o sentido do que vemos.
juntando o que vemos, precisamos menos defender o que vemos e ficamos mais livres para nos libertar do que vemos...